sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Carta ao Vice-Reitor da Universidade do Minho Dr. José Mendes

09-09-2013 17:43

Carta ao Vice-Reitor da Universidade do Minho Dr. José Mendes

Exmo. Sr. Dr.

Não tenho o grato prazer de o conhecer, mas contudo vou tomar a ousadia de lhe escrever esta carta, não pelo correio, mas usando o meio mais simples actualmente que é o meu blogue e o meu perfil de facebook. Quiçá a sorte não me protege e V. Exa. terá acesso à mesma.

Após justificar o meio, deixe por favor que me apresente.

Chamo-me Fernando, fui, sou e serei eternamente um académico, para V. Exa. um "praxista". Tenho 49 anos, sou pai de duas filhas, uma delas já estudante Universitária na Universidade do Porto. De modo a descansar V. Exa. dir-lhe-ei ainda que não estou na "praxe", sendo até "non-gratu" na Praxe do Porto.
Agora que minimamente já me conhece, é meu dever justificar o porquê desta missiva.
Li com muita atenção o artigo de opinião que V. Exa. escreveu no Jornal de Noticias de 08 Setembro de 2013, ou seja, ontem. Estou ciente que é um artigo de opinião e como tal é livre já que felizmente estas ainda não pagam impostos. Após a leitura cuidada, senti necessidade de escrever a V. Exa. para poder fazer-lhe chegar também umas simples ideias de um mero veterano, ainda por cima um "non-gratu" das Tradições Académicas.
Durante os anos que participei em Tradições Académicas, nunca humilhei, nunca me senti humilhado, nunca pratiquei nem deixei praticar na minha presença qualquer acto que fosse passivel de ser considerado atentado contra quem quer que fosse. A prova caro Sr. Dr. é que ainda hoje juntamos os antigos estudantes da minha Faculdade, uns que "praxei", outros que me "praxaram" e para grande espanto dos "anti"  deste país a emoção, a amizade, a camaradagem, a felicidade de nos revermos é tanta que tenho a certeza todos nós teremos o maior prazer em o convidar a participar no próximo Encontro de Antigos Alunos de Letras de modo a que V. Ex. possa confirmar com os próprios olhos a veracidade desta afirmação.
Tal como V. Exa. também eu não gosto particularmente dos palavrões que se ouvem nas praxes, mas gostaria de lhe dizer que a culpa é talvez do grau de educação que aos poucos se vai degradando, não só nas "praxes" mas na Sociedade em geral. A começar pelos governantes. Tal como V. Exa. nem eu, nem os Orgão de Tradições Académicas desresponsabilizam os académicos que cometem erros, quiçá até sejam bem mais justos que os que nos governam uma vez que estes desresponsabilizam sempre os "amigos" que escolheram. É verdade sr. Dr., na Tradição Académica fazemos amigos, não é obrigatório estar na Tradição para fazer amigos, mas que ajuda, ajuda.
Diz no artigo V. Ex. que: "... Gostei de ser praxado quando joguei futebol, onde não existiu hierarquia nem punição. Gostei de ser praxado quando servi como militar, onde existiu hierarquia mas ninguém me ofendeu... ".
Sabe, por acidente V. Exa. quantas queixas existem sobre as "praxes" militares, ou sobre as praxes no Desporto? É que são muitas. Contudo, não consigo ver artigos contra elas em dia de cada nova incorporação de militares, ou de inicio de época de cada Clube.
A Tradição Académica é um modo de vida perfeitamente igual a outros modos de vida que por aí proliferam. Uns gostam de Futebol, eu pessoalmente não gosto. Uns querem mudar o Mundo com a politica, outros como eu acreditam que ensinar regras de educação, de urbanidade, de camaradagem, de solidariedade  são modos de conseguir mudar o mundo para melhor. Saiba V. Exa. que todas as regras de Tradição Académica têm um fundamento pedagógico, é necessário é que não se seja "carneiro" e se procure onde estão.
No seu artigo fale em pintura de caloiros. Não sei a realidade da U.M. mas na minha Academia as pinturas estão proíbidas pelas Tradições Académicas desde 1990. Isto para evitar problemas de pele e porque "o Baton é posterior à Tradição Académica".
Quando às sugestões que V. Exa. oferece no seu "Utilis Praxis,Sed Praxis", convém explicar-lhe algo que penso V. Exa. não está ao corrente.
É uma das maiores regras de Tradição Académica a Solidariedade. Caso V. Exa. não saiba, é tradicional os Académicos se apoiarem nas actividades e mesmo em oferecer "trajos académicos" aos colegas que embora o querendo não têm possibilidades de o comprar. Já agora com uma caracteristica muito especial, existe um certo "secretismo" na situação porque estes seres de "sorriso sedente, quase ameaçador" têm alguns conhecimentos de vida que não os deixa permitir que colegas sejam discriminados por condições economicas.
Saberá V. Exa. que é Tradição Académica existir na semana de "recepção ao caloiro" e na "queima da fitas", na U.M. também, um "Dia de Beneficiência" em que os estudantes dedicam-se a fazer um peditório para instituições que necessitam? Contudo, a Ideia de distribuir comida pelos "sem-abrigo" é uma excelente ideia, que só não proponho que se faça no Porto, porque me encontro "fora da praxe" como anteriormente informei V. Exa, contudo penso que seria de maior utilidade ter atenção e apoiar os colegas que para estudar passam fome, como se vai fazendo, porque as propinas são demasiado elevadas.
Quanto à ideia de "cortar relva no Campus" penso que também é uma ideia genial, pena é vir de um elemento de uma Reitoria que mandava identificar os estudantes trajados que se abeiravam de um colega para o ajudar a matricular, coisa que também é tradicional entre as Tradições Académicas. Como será possivel aos meus colegas da U.M. levarem a efeito a ideia de V. Exa. se não podem chegar sem serem identificados aos colegas "caloiros".

Sabe Sr. Dr., tenho esta ideia desde à muitos anos. Os maiores culpados das graves situações que infelizmente vão acontecendo por aí é das Direcções das Faculdades e das Reitorias. Eu sei que isto é um bocado forte mas deixe que me explique. No meu tempo de caloiro e até veterano, as Praxes eram levadas a efeito dentro das Instituições. Logo era muito mais fácil que fossem controladas quer pelas direcções quer pelos Veteranos de cada Instituição. Os exageros eram assim travados mal alguma ideia fora do normal surgia. Agora que V. Exas. decidiram proibir as suas práticas nos "Campus", o que acontece é que elas são levadas a cabo em vários locais, o que torna impraticável a supervisão dos "anciãos" às mesmas.
Não é possível que V. Exas. que assistem aos Cortejos das Queimas das Fitas, ou do "Enterro da Gata" no caso, tenham a ousadia de pensar que aquela quantidade enorme de Jovens é toda um bando de "gente que não sabe o que faz", ou que "é maluca para andar naquelas coisas a ser humilhada", ou mesmo para chorar copiosamente abraçados uns aos outros e aos seus doutores no final de cada cortejo.
Eles choram Sr. Dr. porque sabem que são um. Eles choram Sr. Dr. porque sabem que as atenções e o carinho que durante um ano receberam dos mais velhos acaba naquele momento. Eles choram Sr. Dr. porque não têm a certeza se serão capazes de dar aos outros o que a eles foi dado. Eles choram Sr. Dr. porque não são Veteranos, se o fossem tinham a certeza que Tradição Académica é Vida e Paixão" e que aquelas lágrimas já são uma primeira demonstração da sua Paixão.
Mas sabe, Sr. Dr. a Tradição Académica tem um enorme problema para resolver. É que cada vez existem mais académicos e cada vez se torna mais dificil ensinar a viver e sentir o que é "Ser Académico". Eu já ensinei algumas gerações, agora tenho reparado como ensinam a minha fillha, e devo-lhe dizer que sinto um enorme Orgulho em ver a minha filha de "Capa e Batina" a receber caloiros, e de a ver na Tuna Académica, outro elemento das Tradições Académicas que V. Exas. infelizmente só se lembram quando vos dá jeito. Sabe, Sr. Dr. sigo com olhar atento e de "veterano" as praxes que lhe fizeram e devo afirmar-lhe que estou imensamente grato aos "doutores e veteranos" que a ensinaram porque consigo ver nos olhos dela não a minha paixão, porque essa é muito minha, mas a paixão que ela tem pela mesma Tradição que o Pai tanto defendeu, defende e defenderá sempre que necessário.
            Finalizando gostaria de lhe dizer que no "Dura Praxis Sed Praxis" sempre esteve incluído o seu "Utilis Praxis Sed Praxis" é necessário é que se esteja mais Atento.
Um Académico Ad Eternum
Fernando Borges

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